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16 de março de 2021

Novos contornos da denúncia espontânea na compensação tributária

O instituto da denúncia espontânea, previsto no artigo 138 do Código Tributário Nacional – CTN, não é novidade em nosso ordenamento jurídico e remonta à antiga Consolidação das Leis do Imposto de Consumo, Decreto nº 26.149 de 1949, em molde bastante semelhante à atual previsão.

Devidamente aperfeiçoado e incluído no CTN desde a origem, constituiu louvável medida legislativa, que incentiva os contribuintes a autorregularização, com a exclusão da multa, desde que o recolhimento a destempo seja realizado com o acréscimo dos juros e antes de iniciado qualquer ato fiscalizatório.

O instituto é importante não só para os contribuintes, que encontram incentivo para autoregularização, mas também para o próprio fisco, que recupera valores em aberto, sem a necessidade de instauração de procedimentos de cobrança ou fiscalização.

Todavia, importante debate se instaura com relação à possibilidade de fruição do benefício quando a regularização do débito (a destempo) ocorre por meio da compensação tributária.

A Receita Federal do Brasil e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional têm se posicionado pela impossibilidade de aplicação da denúncia espontânea nos casos em que a quitação acontece mediante compensação tributária. Segundo as autoridades, a expressão “pagamento” empregada pelo artigo 138 do CTN, compreenderia apenas o recolhimento em espécie, vedando a quitação mediante compensação, pois, diferentemente do pagamento, na compensação a extinção do crédito tributário não ocorre de forma automática, já que está sujeita à análise das autoridades fiscais.

Por outro lado, os contribuintes defendem a aplicação dessa autorregularização também aos casos de quitação por meio da compensação, valendo-se da interpretação sistemática do direito tributário, que permite a quitação de tributos não só por meio do pagamento em espécie, mas também por meio da compensação, quando a legislação assim permitir.

Vale lembrar que o artigo 156, II, do CTN, prevê tanto o pagamento quanto a compensação como modalidades de extinção do crédito tributário: afinal, a compensação é o pagamento com crédito.

Nas esferas administrativa e judiciária, a discussão caminhou por longo período, produzindo decisões favoráveis tanto para os contribuintes como para o fisco, todavia, em 2018, a Primeira Sessão do Superior Tribunal de Justiça – STJ proferiu decisão favorável às autoridades fiscais (AgInt nos EDcl nos EREsp 1657437).

Embora a decisão do STJ não tenha ocorrido na sistemática dos recursos repetitivos, os juizados têm replicado o entendimento do STJ. No âmbito administrativo, da mesma forma, a tese do fisco encontrava respaldo na Solução de Consulta COSIT nº 233, de 16 de agosto de 2019.

Recentemente, uma nova luz se acendeu para os contribuintes. No início deste ano, a 3ª Turma da Câmara Superior do CARF proferiu acórdão julgando procedente o recurso especial do contribuinte e reconheceu que a compensação de valores em aberto pode ser caracterizada como denúncia espontânea, equiparando a compensação ao pagamento em espécie, afastando, dessa forma, a incidência de multa.

A decisão certamente traz um novo paradigma e privilegia a vontade do legislador em estimular a autoregularização.

A sistemática tributária atual permite a utilização de diversos créditos por parte dos contribuintes para quitação de tributos, especialmente no âmbito federal, portanto, não faz sentido algum permitir a compensação (legalmente prevista) como forma de extinção do crédito tributário e, por outro lado, não estimular a autoregularização com esta forma de quitação.

A decisão proferida pelo Tribunal administrativo (CARF) conserta um equívoco do passado, agora, resta aguardar que o judiciário também revisite sua jurisprudência e volte a respeitar integralmente a intenção do legislador quando da criação do instituto da denúncia espontânea, estimulando, assim, a autoregularização dos contribuintes, por qualquer forma de extinção do crédito tributário prevista no artigo 156 do CTN.