Fernandes Figueiredo em Foco

1 de agosto de 2019

A contínua ratificação da boa-fé como pilar do ordenamento jurídico

Em recente decisão, proferida em junho pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no julgamento do REsp 1.559.348, relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, decidiu-se pela manutenção da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal – TJDF e, consequentemente, pela possibilidade de um bem de família ser executado como garantia de um empréstimo utilizando a ausência de boa-fé como argumento central para autorizar a exceção à regra

A regra geral, inscrita no Código Civil – CC (artigos 1.711 e seguintes) e pela Lei nº 8.009/90, fixa que o bem de família, ou seja, aquele imóvel residencial utilizado pela entidade familiar, será impenhorável a não ser pelo enquadramento em uma das hipóteses listadas pelo artigo 3º da própria lei: (i) titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, (ii) alimentos, (iii) cobrança de impostos vinculados ao imóvel, (iv) execução da hipoteca do imóvel, ou, ainda (v) na hipótese de o imóvel ter sido adquirido como produto de crime.

Nesse sentido, o bem de família será impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou fi lhos que sejam seus proprietários e nele residam, ressalvadas as hipóteses legais e, ainda, nos casos em que há violação da boa-fé.

A decisão do STJ e, consequentemente, do TJDF, contudo, não apenas representam um paradigma (1) impactante por alargar o rol de exceções vinculados à impenhorabilidade do bem de família, mas também vem ao encontro do quanto previsto no Código de Processo Civil – CPC e no CC, principais marcos legais do direito privado, no que diz respeito à importância da boa-fé.

Pois bem, o CPC vigente (artigos 5º, 322 e 489) exige o comportamento de boa-fé de todos os participantes do processo e, ainda, que a interpretação tanto dos pedidos quanto das decisões judiciais também tenha o princípio da boa-fé como parâmetro norteador.

No CC, por sua vez, o princípio da boa-fé é citado 55 vezes pelo legislador e seria ingenuidade interpretar que esse relevante número de citações seja apenas coincidência. Evidente, portanto, que os Tribunais pátrios e a legislação vigente têm convergido esforços para que a atuação no judiciário sempre leve em consideração a boa-fé.

No caso em concreto, a recorrente efetuou um empréstimo junto à renomada instituição financeira para reforçar o fluxo de caixa de sua empresa e voluntariamente ofereceu o “bem de família” como garantia, sendo que no contrato, ainda, constou a expressa anuência do coproprietário.

Em virtude do inadimplemento contratual, a instituição financeira executou a garantia e a recorrente, alegando ser bem de família e, portanto, impenhorável, litiga na tentativa de afastar a penhora.

Rui Barbosa, notável jurista brasileiro, que viveu entre os anos 1849 e 1923, defendia, ainda no início do século XX, que “a boa-fé é possível ainda nas situações mais perdidas”. Inquestionável que minimamente há flagrante contradição na postura da recorrente, uma vez que esta, livremente e sem qualquer ressalva, ofereceu seu imóvel (até então considerado bem de família e, portanto, impenhorável) como garantia de dívida e agora busca afastar eficácia da garantia dada.

A decisão do STJ, portanto, consagra, mais uma vez, a boa-fé como pilar do ordenamento jurídico brasileiro e, ainda, colabora na manutenção do equilíbrio do marcado, na medida em que o mesmo é consideravelmente impactado quando as garantias, principalmente aquelas vinculadas à empréstimos relevantes, são fragilizadas. O acórdão, ainda não publicado, fatalmente será relevante e colaborará para seguir fomentando a importância da boa-fé.

(*) É sócio fundador do FF Advogados, responsável pelas áreas de Direito Público e direito contábil IFRS (edison.fernandes@fflaw.com.br)

(**) É advogado do FF Advogados, atua nas áreas de Contencioso cível, família, sucessões e arbitragem (bruno.maglione@fflaw.com.br)

 

(1) – A decisão levou em consideração a posição da 3ª Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.141.732, que fixou ser determinante a constatação da boa-fé do devedor para que se possa reconhecer a proteção da impenhorabilidade prevista em lei[:en]Em recente decisão, proferida em junho pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no julgamento do REsp 1.559.348, relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, decidiu-se pela manutenção da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal – TJDF e, consequentemente, pela possibilidade de um bem de família ser executado como garantia de um empréstimo utilizando a ausência de boa-fé como argumento central para autorizar a exceção à regra

A regra geral, inscrita no Código Civil – CC (artigos 1.711 e seguintes) e pela Lei nº 8.009/90, fixa que o bem de família, ou seja, aquele imóvel residencial utilizado pela entidade familiar, será impenhorável a não ser pelo enquadramento em uma das hipóteses listadas pelo artigo 3º da própria lei: (i) titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, (ii) alimentos, (iii) cobrança de impostos vinculados ao imóvel, (iv) execução da hipoteca do imóvel, ou, ainda (v) na hipótese de o imóvel ter sido adquirido como produto de crime.

Nesse sentido, o bem de família será impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou fi lhos que sejam seus proprietários e nele residam, ressalvadas as hipóteses legais e, ainda, nos casos em que há violação da boa-fé.

A decisão do STJ e, consequentemente, do TJDF, contudo, não apenas representam um paradigma (1) impactante por alargar o rol de exceções vinculados à impenhorabilidade do bem de família, mas também vem ao encontro do quanto previsto no Código de Processo Civil – CPC e no CC, principais marcos legais do direito privado, no que diz respeito à importância da boa-fé.

Pois bem, o CPC vigente (artigos 5º, 322 e 489) exige o comportamento de boa-fé de todos os participantes do processo e, ainda, que a interpretação tanto dos pedidos quanto das decisões judiciais também tenha o princípio da boa-fé como parâmetro norteador.

No CC, por sua vez, o princípio da boa-fé é citado 55 vezes pelo legislador e seria ingenuidade interpretar que esse relevante número de citações seja apenas coincidência. Evidente, portanto, que os Tribunais pátrios e a legislação vigente têm convergido esforços para que a atuação no judiciário sempre leve em consideração a boa-fé.

No caso em concreto, a recorrente efetuou um empréstimo junto à renomada instituição financeira para reforçar o fluxo de caixa de sua empresa e voluntariamente ofereceu o “bem de família” como garantia, sendo que no contrato, ainda, constou a expressa anuência do coproprietário.

Em virtude do inadimplemento contratual, a instituição financeira executou a garantia e a recorrente, alegando ser bem de família e, portanto, impenhorável, litiga na tentativa de afastar a penhora.

Rui Barbosa, notável jurista brasileiro, que viveu entre os anos 1849 e 1923, defendia, ainda no início do século XX, que “a boa-fé é possível ainda nas situações mais perdidas”. Inquestionável que minimamente há flagrante contradição na postura da recorrente, uma vez que esta, livremente e sem qualquer ressalva, ofereceu seu imóvel (até então considerado bem de família e, portanto, impenhorável) como garantia de dívida e agora busca afastar eficácia da garantia dada.

A decisão do STJ, portanto, consagra, mais uma vez, a boa-fé como pilar do ordenamento jurídico brasileiro e, ainda, colabora na manutenção do equilíbrio do marcado, na medida em que o mesmo é consideravelmente impactado quando as garantias, principalmente aquelas vinculadas à empréstimos relevantes, são fragilizadas. O acórdão, ainda não publicado, fatalmente será relevante e colaborará para seguir fomentando a importância da boa-fé.

(*) É sócio fundador do FF Advogados, responsável pelas áreas de Direito Público e direito contábil IFRS (edison.fernandes@fflaw.com.br)

(**) É advogado do FF Advogados, atua nas áreas de Contencioso cível, família, sucessões e arbitragem (bruno.maglione@fflaw.com.br)

(1) – A decisão levou em consideração a posição da 3ª Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.141.732, que fixou ser determinante a constatação da boa-fé do devedor para que se possa reconhecer a proteção da impenhorabilidade prevista em lei[:es]Em recente decisão, proferida em junho pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no julgamento do REsp 1.559.348, relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, decidiu-se pela manutenção da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal – TJDF e, consequentemente, pela possibilidade de um bem de família ser executado como garantia de um empréstimo utilizando a ausência de boa-fé como argumento central para autorizar a exceção à regra

A regra geral, inscrita no Código Civil – CC (artigos 1.711 e seguintes) e pela Lei nº 8.009/90, fixa que o bem de família, ou seja, aquele imóvel residencial utilizado pela entidade familiar, será impenhorável a não ser pelo enquadramento em uma das hipóteses listadas pelo artigo 3º da própria lei: (i) titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, (ii) alimentos, (iii) cobrança de impostos vinculados ao imóvel, (iv) execução da hipoteca do imóvel, ou, ainda (v) na hipótese de o imóvel ter sido adquirido como produto de crime.

Nesse sentido, o bem de família será impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou fi lhos que sejam seus proprietários e nele residam, ressalvadas as hipóteses legais e, ainda, nos casos em que há violação da boa-fé.

A decisão do STJ e, consequentemente, do TJDF, contudo, não apenas representam um paradigma (1) impactante por alargar o rol de exceções vinculados à impenhorabilidade do bem de família, mas também vem ao encontro do quanto previsto no Código de Processo Civil – CPC e no CC, principais marcos legais do direito privado, no que diz respeito à importância da boa-fé.

Pois bem, o CPC vigente (artigos 5º, 322 e 489) exige o comportamento de boa-fé de todos os participantes do processo e, ainda, que a interpretação tanto dos pedidos quanto das decisões judiciais também tenha o princípio da boa-fé como parâmetro norteador.

No CC, por sua vez, o princípio da boa-fé é citado 55 vezes pelo legislador e seria ingenuidade interpretar que esse relevante número de citações seja apenas coincidência. Evidente, portanto, que os Tribunais pátrios e a legislação vigente têm convergido esforços para que a atuação no judiciário sempre leve em consideração a boa-fé.

No caso em concreto, a recorrente efetuou um empréstimo junto à renomada instituição financeira para reforçar o fluxo de caixa de sua empresa e voluntariamente ofereceu o “bem de família” como garantia, sendo que no contrato, ainda, constou a expressa anuência do coproprietário.

Em virtude do inadimplemento contratual, a instituição financeira executou a garantia e a recorrente, alegando ser bem de família e, portanto, impenhorável, litiga na tentativa de afastar a penhora.

Rui Barbosa, notável jurista brasileiro, que viveu entre os anos 1849 e 1923, defendia, ainda no início do século XX, que “a boa-fé é possível ainda nas situações mais perdidas”. Inquestionável que minimamente há flagrante contradição na postura da recorrente, uma vez que esta, livremente e sem qualquer ressalva, ofereceu seu imóvel (até então considerado bem de família e, portanto, impenhorável) como garantia de dívida e agora busca afastar eficácia da garantia dada.

A decisão do STJ, portanto, consagra, mais uma vez, a boa-fé como pilar do ordenamento jurídico brasileiro e, ainda, colabora na manutenção do equilíbrio do marcado, na medida em que o mesmo é consideravelmente impactado quando as garantias, principalmente aquelas vinculadas à empréstimos relevantes, são fragilizadas. O acórdão, ainda não publicado, fatalmente será relevante e colaborará para seguir fomentando a importância da boa-fé.

(*) É sócio fundador do FF Advogados, responsável pelas áreas de Direito Público e direito contábil IFRS (edison.fernandes@fflaw.com.br)

(**) É advogado do FF Advogados, atua nas áreas de Contencioso cível, família, sucessões e arbitragem (bruno.maglione@fflaw.com.br)

(1) – A decisão levou em consideração a posição da 3ª Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.141.732, que fixou ser determinante a constatação da boa-fé do devedor para que se possa reconhecer a proteção da impenhorabilidade prevista em lei