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26 de junho de 2023

Aduana: quem paga a conta da greve?

 

Atuar com comércio exterior é um desafio diário. Como se não bastasse o cuidado com as informações a serem prestadas, com os prazos para entrega de documentos e a necessária atenção aos detalhes da operação e de logística, muitos entraves ainda permeiam o procedimento de nacionalização e remessa de cargas.

A intervenção de distintos agentes no comércio exterior, se não for cuidadosamente coordenada, resulta em graves prejuízos para o importador ou exportador, uma vez que, além de multas formais, o atraso na liberação da mercadoria gera custos extras tanto do porto, como armazenagem e capatazia, quanto de logística, como diárias extras de veículos transportadores, detention ou demurrage, podendo até perder o booking contratado.

São diversas as multas passíveis de serem aplicadas no curso do processo, inclusive por circunstâncias alheias à vontade do proprietário da carga. Exemplos dessas multas são em razão da inexatidão de informações constante nos documentos, como por exemplo, a divergência no peso da carga ou a classificação fiscal do produto contestada pela autoridade fiscal, ou ainda atraso
no deferimento de qualquer licença regulatória necessária.

Ainda que o Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009) preveja alguns prazos para o processo de despacho aduaneiro, como se pode verifica, nem sempre eles são respeitados pelos intervenientes.

Cada intercorrência no procedimento de nacionalização que implica em multa e custos extras oneram a operação previamente planejada e, consequentemente, modificam o preço final do produto. Tais gastos adicionais podem levar a total falta de viabilidade do negócio.

Como se não bastasse todo esse imbróglio que pode ocorrer, há ainda outras intempéries que fogem ao controle das empresas: são licenças que demoram a ser deferidas por ausência de analistas técnicos, mercadorias que não são vistoriadas por insuficiência de auditores fiscais, reclassificação de mercadorias indevida por desconhecimento sobre os produtos, e, como não poderia deixar de mencionar… a greve!

Na chamada “operação padrão”, os fiscais atuam em determinados dias da semana na análise dos processos de comércio exterior, causando um acúmulo de trabalho e atrasando todo o procedimento de despacho aduaneiro, onerando desproporcionalmente o negócio.

E todo esse ônus é arcado exclusivamente pelo dono da carga!

É comum que na duração do movimento grevista, muitos importadores recorram ao Pode Judiciário a fim de assegurar o cumprimento dos prazos previstos na legislação, a fim de minimizar prejuízos. Nesse sentido, recente decisão obrigou a União a ressarcir o valor da armazenagem em porto ao importador, que teve seu processo atrasado por 23 dias decido à greve dos fiscais.

A decisão sustenta que a União não comprovou qualquer ocorrência de natureza extraordinária que justificasse o não atendimento do prazo de oito dias para conclusão do desembaraço aduaneiro, e que caberia à União demonstrar quantos, dos 23 dias que o processo tramitou, foram utilizados pelo importador para cumprir eventuais exigências, o que não o fez.

Dessa forma, concluiu a sentença que, em razão do excesso de prazo para a conclusão do despacho aduaneiro pela autoridade fiscal, o importador suportou despesas adicionais indevidas, para as quais não deu causa, devendo ser indenizada pelo responsável, ou seja, a União.

Essa decisão traz alento para todo o mercado, haja vista que uma vez que um movimento grevista é um temor para os operadores do comércio exterior, e passa a ser um sinal de alerta para a União, que deve agir com mais rigor no tratamento ao movimento grevista, correndo o risco de ser responsabilizada pelos custos decorrentes desse atraso.