Alienação Fiduciária e o Marco Legal das Garantias
Por: Elisa Figueiredo e Marjorie Helvadjian
Muito tem se falado sobre a já publicada Lei nº 14.711/2023, apelidada de “O Novo Marco Legal das Garantias”, que tem como objetivo principal reduzir os custos do crédito e a inadimplência dos devedores, facilitando o procedimento para satisfação do crédito.
Em outro artigo publicado em nosso Conteúdo Jurídico, abordamos que o Novo Marco Legal das Garantias deu vida nova à hipoteca.
Agora vamos tratar da possibilidade de alienação fiduciária da propriedade superveniente, suscetível de registro no Registro de Imóveis desde a data de sua celebração, a qual se tornará eficaz tão somente a partir do cancelamento da propriedade fiduciária anteriormente constituída.
Significa dizer, na prática, que passa a ser permitido ao devedor, ao contrair uma segunda dívida, dar como garantia um imóvel que já foi alienado fiduciariamente a outro ou ao mesmo credor, permitindo a criação de alienações fiduciárias sucessivas sobre um mesmo imóvel.
Referido tratamento é semelhante ao que era oferecido para hipotecas e penhores, para os quais já se admitia a criação de ônus de graus sucessivos, o que não era permitido para alienação fiduciária. Estamos diante, portanto, de uma alteração bastante relevante.
Nestes casos, como se espera, as garantias anteriores terão prioridade em relação às posteriores na excussão a garantia (o que foi ressalvado com as alterações do art. 22, §4º, da Lei nº 9.514/97), observado que, no caso de excussão do imóvel pelo credor fiduciário anterior, os direitos dos credores fiduciários posteriores sub-rogam-se no preço obtido, cancelando-se, neste caso, os registros das respectivas alienações fiduciárias.
A Lei nº 14.711/23 prevê, ainda, que o inadimplemento de qualquer das obrigações garantidas pela propriedade fiduciária possibilita que o credor declare o vencimento antecipado de todas as demais obrigações de que for titular garantidas pelo mesmo imóvel (art. 22, §6º da Lei nº 9.514/97) e ressalva, expressamente, que o instrumento constitutivo da alienação fiduciária sucessiva deve, obrigatoriamente, prever uma cláusula com essa faculdade do credor (art. 22, §8º da Lei nº 9.514/97).
Para reforçar ainda mais a segurança do credor ao receber um imóvel como garantia, via alienação fiduciária, o Marco Legal das Garantias introduziu também a possibilidade de o credor cobrar eventual saldo remanescente da dívida, caso os valores obtidos com a venda do imóvel alienado fiduciariamente não sejam suficientes para quitar a dívida. Referida previsão possui uma exceção, em se tratando de alienação fiduciária decorrente de financiamento para aquisição de imóvel residencial (exceto via consórcio), hipótese em que deve ser mantida a extinção da dívida, como até então previsto pela Lei (art. 26-A, §4º da Lei nº 9.514/97).
A possibilidade de alienações fiduciárias sucessivas, somada ao fato de o devedor continuar obrigado pelo pagamento do saldo remanescente da dívida, são mudanças relevantes e sensíveis que impactarão na sistemática de negociações, em especial com instituições financeiras, o que possivelmente reduzirá a inadimplência e a dificuldade na aquisição de crédito.