Como ficará a correção das dívidas civis com o Novo Código Civil?
Por: Bruno Maglione e Victoria Soranz
Não foi sem razão que a modernização do Código Civil brasileiro passou a ser considerada uma pauta urgente e necessária diante das rápidas transformações sociais, econômicas e tecnológicas em que a nossa sociedade vive diariamente.
Embora represente um dos principais pilares do sistema legal, é importante reconhecer que um código elaborado há mais de duas décadas naturalmente torna-se progressivamente obsoleto diante das novas dinâmicas da sociedade atual.
Nesse sentido, o anteprojeto de alteração do Código Civil surgiu como uma resposta necessária às demandas por modernização e adaptação do ordenamento jurídico brasileiro. Esta iniciativa legislativa busca revisar e ajustar o então Código vigente, de modo a torná-lo mais eficiente, justo e adequado às necessidades contemporâneas da sociedade, sem incorrer em mudanças fantasiosas.
Para tanto, a comissão de juristas presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão analisou sugestões enviadas pela sociedade[1], realizou diversas audiências públicas[2], com o suporte da Consultoria Legislativa do Senado[3], o que resultou na elaboração de um texto que abrange mais de mil artigos.
Um exemplo emblemático dessa necessidade de atualização pode ser demonstrado com o projeto de alteração do artigo 406, que trata acerca da fixação dos juros legais. Segundo a norma (ainda) vigente, quando os juros moratórios não forem convencionados, forem sem taxa estipulada ou, ainda, quando provierem de determinação legal, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.
Embora o dispositivo venha cumprindo seu papel ao longo dos anos, após análise minuciosa da comissão de juristas, a relatoria-geral entendeu que, para preservar a segurança jurídica, a taxa deveria ser fixada em um por cento ao mês, nos termos do atual artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional[4].
Além disso, o anteprojeto propõe a inclusão de um parágrafo único, sob o qual ficará determinado que ao definirem previamente a taxa de juros moratórios, as partes devem respeitar um limite de 2% ao mês. Essa medida visa proteger os devedores de taxas excessivamente onerosas e promover um maior equilíbrio nas relações contratuais.
A reforma ganha ainda mais relevância quando, em paralelo aos trabalhos da Comissão, vem sendo travada uma importante discussão no Superior Tribunal de Justiça (STJ), no âmbito do Recurso Especial nº 1.795.982[5],
Apesar do polêmico julgamento ainda não ter sido efetivamente concluído devido a divergências formais levantadas pelo também Ministro Relator Luis Felipe Salomão, a tendência majoritária no STJ é favorável à aplicação da Selic, o que automaticamente potencializa a instabilidade jurídica da discussão.
A análise do tema ainda vai longe, tanto dentro quanto fora da Corte. Há quem defenda firmemente que a Selic é a melhor opção, argumentando que a taxa facilita o cálculo, pois possui uma natureza mista de juros e correção monetária, dispensando a acumulação com um índice de atualização separado. Por outro lado, há quem problematize justamente essa argumentação, pois, em casos de danos morais, a correção do valor e os juros de mora não começam ao mesmo tempo, tornando a Selic uma “camufladora” de atualização, estimulando, ainda que indiretamente, a inadimplência.
Fato é que o tema deve ser acompanhado de perto, visto que o estabelecimento de uma nova regra para a fixação da taxa implicará em mudanças significativas não apenas no cenário econômico, mas também nas relações contratuais e ações em curso do país como um todo.