Equilíbrio contratual na Reforma Tributária
Por: Elisa Junqueira Figueiredo
A concepção de um contrato passa por diversas etapas, iniciando pelo alinhamento de expectativas de cada parte com o negócio que se iniciará. As partes iniciam as negociações e sempre devem ter em mente quais são os interesses em jogo no contrato a ser firmado.
Usualmente as empresas estão focadas, ao conceber um contrato, no desenvolvimento de suas atividades e, no fim, em auferir lucros.
A formação do preço, portanto, é um elemento fundamental a ser considerado pelas partes contratantes. De um lado, a parte contratada, que irá receber o preço (na verdade, a contrapartida pelo serviço prestado ou pela mercadoria vendida), e, de outro lado, a parte contratante, que irá pagar o valor acordado, têm preocupação com o preço contratado e expectativas de recebimento ou gasto (a depender da posição contratual).
Lembre-se que as expectativas de cada uma das partes na fase de negociações, ao celebrar o contrato, se transformam em direitos e obrigações e, portanto, passam a ser oponíveis de parte a parte.
Diversos são os elementos a serem considerados na formação do preço. Os tributos a serem retidos e/ou recolhidos pelas partes são componentes que invariavelmente são (ou deveriam ter sido) considerados por ambas as partes nas negociações e na celebração do contrato. E é sobre eles, os tributos, e seus impactos nos contratos, que chamamos a atenção aqui.
A reforma tributária, aprovada no fim de dezembro de 2023, traz importantes e relevantes mudanças na tributação, especialmente no imposto sobre consumo e sua forma de cálculo. Assim, acaba por impactar diretamente na formação de preço e, portanto, nos contratos (já celebrados e futuros).
Não nos preocupamos aqui, com contratos ainda em fase de negociação primária ou mesmo futuros contratos, pois as partes já têm elementos suficientes para se precaver dos impactos da reforma tributária ao celebrar o contrato, ainda que certas definições e alíquotas ainda dependam de lei complementar. Um advogado especialista em contratos, com apoio de tributaristas, certamente poderá inserir no contrato regras que protejam as partes dos impactos da reforma tributária a ser ainda regulamentada e implementada.
Não que a reforma tributária não impacte a avaliação e a negociação dos contratos a serem firmados, mas o foco, aqui, está nos contratos já celebrados. Não se deve esperar lei complementar ou a efetiva vigência das disposições da reforma tributária, que, como sabido, será implantada ao longo de anos e traz também regras de transição, para se preocupar com os impactos da tributários no contrato, em especial no preço (a ser pago ou recebido). As chances de um desequilíbrio entre os valores orçados e provisões da contabilidade e o que será recolhido/pago são grandes.
Para a tentativa de manutenção do equilíbrio contratual e das finanças da empresa que paga ou recebe o preço (e recolhe tributos), mais do que isso, da confiança mútua, as partes devem começar já a entender se há e qual o impacto da reforma tributária no contrato celebrado e, portanto, a rever os contratos celebrados, começando com uma análise interna e, depois, passar pela fase de negociação com a outra parte, se o caso.
Para ilustrar a importância da revisão dos contratos, o Governo criou diversos grupos técnicos para discutir as leis complementares necessárias para a implantação da reforma tributária e um deles (o GT 8) justamente para o “reequilíbrio de contratos de longo prazo”, inclusive em matérias de concessão.
Em um contrato de longo prazo, por exemplo, os tributos vêm sendo calculados com base na legislação até então em vigor, passarão a ser calculados com base nas regras de transição e, ao final, já serão regrados pelas novas disposições tributárias oriundas da novel reforma tributária. Qual é e será o impacto disso no caixa e nas contas de sua empresa?
Diversas empresas já começaram com esse movimento de revisão contratual e certamente estarão mais preparadas e protegidas contra os impactos (negativos) da reforma tributária.
A antecipada análise dos contratos já celebrados é a única forma de se antever se existirão e quais são os impactos tributários para cada uma das partes no contrato. E quanto antes revisados os contratos, maiores as chances de mitigar riscos e restabelecer o equilíbrio contratual pretendido quando de sua celebração.