Teletrabalho: doenças psicológicas e o nexo causal
A pandemia alterou o cenário mundial e com ela o mercado de trabalho e suas relações. Para atender à necessidade de isolamento social, diversas empresas aderiram à prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, o chamado teletrabalho (ou home office ou ainda anywhere office).
O teletrabalho consiste na modalidade de trabalho realizada fora do ambiente físico da empresa, com a utilização de recursos tecnológicos. Seu desenvolvimento pode ocorrer na casa do empregado, em coworking, em cafeterias ou em qualquer lugar.
Considerando que a necessidade de adaptação foi imediata e inesperada, além de que muitos espaços para o desenvolvimento do teletrabalho (telecentros) foram fechados em observância aos protocolos sanitários, a maioria dos empregados não viu outra opção senão desenvolver suas atividades em sua própria residência, na forma de home office.
O home office encontra diversos obstáculos na sua aplicação, desde sua parte burocrática, como a necessidade de aditivo contratual, bem como dificuldades nas condições físicas e cognitivas de trabalho, desde mobiliário e equipamentos de trabalho até apoio tecnológico e capacitação dos empregados.
Mas não é só isso. Não são só os empregados que estão em casa. O coronavírus (Covid-19) trouxe impacto geral no ambiente domiciliar: creches e escolas fechadas, crianças em casa, familiares desempregados e, como resultado da soma de fatores, o novo mal do século: o desenvolvimento de doenças psíquicas.
Um estudo feito pelo Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a partir de dados coletados entre março e abril de 2020, demonstra que o percentual de pessoas com depressão foi de 4,2% para 8%, enquanto para os quadros de ansiedade o índice foi de 8,7% para 14,9%.
Essa constatação deve chamar a atenção das empresas que podem sofrer consequências jurídicas e financeiras caso o desenvolvimento destas doenças seja relacionado ou agravado pelo trabalho.
Caso o empregado comprove, por meio de prova documental, oral e, principalmente, pericial, que suas condições de trabalho foram responsáveis pelo desenvolvimento ou contribuíram para o agravamento de transtornos mentais, a empresa pode ser condenada ao pagamento de pensão mensal, despesas médicas e indenização por danos morais.
Além disso, reconhecido o nexo causal, a doença é equiparada a acidente de trabalho e o empregado que tiver sido afastado por mais de 15 dias passa a deter estabilidade provisória ao emprego, pelo período de 12 meses, conforme previsto no artigo 118 da Lei nº 8.213/91.
Dessa forma, a fim de reduzir riscos e garantir a saúde física e mental de seus empregados, as empresas devem investir no compliance trabalhista, com a adoção de ética digital, Política de Teletrabalho, canais para informação periódica sobre resultados e atividades, bem como orientações acerca do conteúdo das tarefas, exigências de tempo e ritmo esperado das atividades, garantindo o direito a desconexão e o desenvolvimento do direito da personalidade do empregado.
A aplicação de tais medidas pode não ser o suficiente para elidir, por completo, o aparecimento de qualquer doença psicológica, pois esta pode estar relacionada a fatores externos ao trabalho. No entanto, demonstrar o cuidado com o empregado, com orientações, apoio e ausência de omissão, pode ser o suficiente para afastar a culpa da empresa e, com ela, o nexo causal.